segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Cinema processo ?



Não se trata de ruptura, mas de continuidade. Não há necessidade de reinventar o Cinema em cada filme. Os elementos constitutivos de uma orquestração cinematográfica estão dispostos, em desenvolvimento contínuo e cada vez mais à disposição daqueles que tenham a ousadia de trilhar esse caminho. Continuidade no sentido de dar seguimento na utilização dessas ferramentas: conceituais, estéticas e materiais.
Evidente que toda criação não parte do zero, mas a partir de conceitos e determinações histórico-pessoais de quem lança a proposta da realização do filme. Os sujeitos que o realizam estão marcados por motivações impregnadas de valores aos quais podem dar continuidade reafirmando ou contestando-os. Continuar no sentido de seguir em frente, de construir a estrada e indicar um novo caminho e não retornar ao começo da jornada. E uma vez com as mãos na ferramenta, faz-se necessário que se as use.
A idéia de realizar um filme independente do grupo que chamo de “independente/dependente” surgiu no início de 2004. Naquela época eu e Geraldo Cavalcanti percebemos a possibilidade de realizarmos uma obra em linguagem cinematográfica nordestina, sertaneja, brasileira e universal. Na totalidade porque coletiva e engendrada por profissionais de formação diversificada, ambientada numa região estereotipada ao extremo e que teria a sua existência construída [sob a lógica do “paternalismo” artístico] com quem não tem o direito de fruir cinema: os não-incluidos.
Surge a idéia de Cinema Processo [Viva o Cinema Brasileiro! e Mariposa Blanca], entendido não como forma nem estética, mas logística de produção em aberto. Um sistema que possibilite realizar filmes com o mínimo de dinheiro e o máximo de qualidade artística que o ambiente social/profissional determinado permita. Não se trata de uma alternativa possível, mas de uma empreitada. Só será possível tanto quanto for firmado o compromisso com cada um dos atores/sujeitos necessários para a realização do filme, de que não se trata de realizar um filme, mas de realizar um filme que tem que ser realizado.
Assim sendo, o Cinema Processo aponta as condições materiais necessárias para tornar uma obra cinematográfica realizável, com ou sem muito dinheiro. Evidente que não se possa prescindir de sua existência [do dinheiro], mas de minimizar ao máximo a sua ingerência na decisão de se realizar um filme.
Cinema Processo é a constatação de que é possível realizar filmes com características verossímeis aos atores sociais de determinada região/sociedade/povo. Uma obra, um regimento dos artistas locais de vanguarda, um acordo entre esses técnicos e artistas de que a referida obra tem que impor a sua existência, a conexão das redes de interesse para que essa obra tenha vida. O processo de realização fazendo parte da própria obra para se fazer cinema no sertão, no Brasil e em qualquer lugar do mundo.
Os não-incluidos estão convidados a se incluírem. O filme Viva o Cinema Brasileiro!, obra primeira do Cinema Processo, tem a força do verbo e a euforia da aclamação. Um Viva! ao cinema nordestino, brasileiramente brasileiro, no seu atrevimento por buscar furar o bloqueio. Um filme criado, encenado e protagonizado por pessoas simples e comuns ao universo local/mundial. Um filme com a marca da cor, da areia, da música e da noite do sertão/deserto/oásis.